7. O processo criativo

estimuloVERsensação
elaboraçãoREFLETIRcognição
respostaEXPORjuízo

Começo repetindo a mesma tabela com que encerramos o capítulo anterior. Com uma diferença: a coluna central salta aos olhos pelas maiúsculas em negrito. Por quê?

Para enfatizar o aspecto visual do pensamento.

A premissa central da filosofia de Aristóteles é a ideia de que nada há em nosso espírito, em nossa mente, que não tenha nos chegado primariamente pelos sentidos.

Para os fins deste nosso manual, podemos parafrasear Aristóteles e dizer que nada há em nossa mente que não seja imagem.

Como já disse antes, todos os nossos estímulos mentais, mesmo quando não são estritamente visuais, tendem à visão. Isto é, se ouço um ruído ou sinto um cheiro, a tendência imediata da mente é recorrer à memória, à imaginação e ao entendimento para desses dados sensíveis produzir um quadro ou uma imagem que seja o mais próximo do real, daquilo que está (ou suponho estar) acontecendo naquele momento.

Processo semelhante se dá quando lembramos. Mas, nesse caso, partimos de uma imagem da memória que, intensificada pela imaginação, buscar tornar-se o mais sensível possível. Quem nunca passou pela ilusão de sentir o corpo ausente da pessoa amada ao seu lado na cama, um dia passará. Sentirá na ponta dos dedos alguém que não está ali.

É por isso que os sonhos nos enganam e a saudade nos dói tanto.

O processo se repete se imaginamos uma possibilidade futura ou uma cena de ficção.

Apenas como exemplo, lembro esta passagem clássica de Camões:

Mas conquanto não pode haver desgosto
Onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê.
Que dias há que na alma me tem posto
Um não sei quê, que nasce não sei onde,
Vem não sei como, e dói não sei porquê.


Falamos acima alternadamente em visão, imagem e quadro. Um leitor desatento pode tomar essas palavras por sinônimas. Não estaria inteiramente errado, mas deixaria escapar o essencial.

De novo: visão – imagem – quadro.

Os três termos de fato estão relacionados com o ato de ver – isso é evidente. Pois, se pensarmos bem, logo percebemos que o tempo todo estamos vendo: vemos quando vemos o que nos vai à volta; vemos quando lembramos e imaginamos; vemos quando fazemos matemática ou música (e disso sabem bem os matemáticos e os músicos); vemos quando sonhamos. Vemos, enfim, de olhos abertos ou fechados.

Vemos – e é preciso um esforço muito grande para deixar de ver, isto é, para impedir que as ideias que nos chegam à mente durem o suficiente para formar uma imagem ou um quadro.

Dizem que os esquimós enxergam não sei quantos tons de branco. O mesmo podemos dizer da tríade visão – imagem – quadro: são diferentes tons de ver. Diferentes intensidades de ver.

Vejamos: se falamos em visão, imediatamente pensamos em olho. É como se a visão fosse uma ação mais superficial, contínua e por isso mesmo associada ao movimento.

Mas, se falamos em imagem, o que nos vem à mente é o espelho. O espelho que reflete e, portanto, nos dá uma visão da visão – algo mais denso, minucioso, estático.

E quando falamos em quadro, logo associamos à exposição. O quadro é como que a descrição de uma imagem, a visão da visão da visão.

Se pensarmos em termos de arte, a visão é cinema, a imagem é fotografia e o quadro é pintura.

Auto-retrato triplo, Norman Rockwell.
A visão, a imagem e o quadro.

Dito tudo isso, como você relacionaria esses três termos visuais às operações que constituem o processo cognitivo-criativo, ver, refletir e expor?


ver
visão
refletirimagem
exporquadro

Chegamos ao centro deste manual.

Se escrever é contar histórias, contar histórias é o ato final de um processo que coincide com a construção de um quadro.

É o que veremos a seguir.